Programa de Intervenção Social realizado pelo Movimento das Forças Armadas (MFA) (Programa 10 (I), Trilha 2): Intervenção do tenente-coronel Costa Neves sobre o 11 de Março.
Nível de descrição
Documento simples
Código de referência
PT/ADN/EMGFA/5DIV/022/032
Título
Programa de Intervenção Social realizado pelo Movimento das Forças Armadas (MFA) (Programa 10 (I), Trilha 2): Intervenção do tenente-coronel Costa Neves sobre o 11 de Março.
Datas de produção
1976
a
1976
Dimensão e suporte
1 ficheiro áudio MP4, 29m58
Âmbito e conteúdo
Programa emitido pela Emissora Nacional e produzido pelo Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) onde José Manuel Costa Neves, fala acerca dos acontecimentos do 11 de Março e afirma que foi um incidente militar; Fala como superintendente da Comissão de Inquérito e que as lições tiradas sobre o 11 de Março, ajudam a Comissão do 25 de Novembro. Ambas as comissões tinham legitimidade revolucionária e colidiam com a legalidade. Os ensinamentos resultaram deste casamento entre legitimidade e legalidade. O serviço da Polícia Judiciária Militar baseia-se na legalidade, fala deste processo que foi muito moroso (a fase de investigação). Informa que os julgamentos começarão em breve e que estão dependentes da formação dos tribunais. Dá a conhecer que estão a ser formados cinco Tribunais Militares Territoriais da responsabilidade do chefe de Estado Maior do Exército (CEME), general Ramalho Eanes, a quem serão entregues os casos do 11 de Março, da PIDE-DGS e do 25 de Novembro. Prossegue dizendo que a experiência adquirida com o 11 de Março, serviu para eliminar todos os erros cometidos do ponto de vista metodológico na fase de investigação e de instrução (da responsabilidade do Serviço da Policia Judiciária Militar. José Manuel Costa Neves, afirma que o 25 de Novembro constituiu um perigo para o avanço do processo revolucionário pois ajudou a dividir as Forças Armadas e que o mesmo aconteceu com o 11 de Março. Refere que o processo revolucionário não pode ser feito com demagogias e utopias e que um processo revolucionário tem que ser feito com inteligência, sangue frio e com muita humanidade. Reprodução da intervenção de Vasco Lourenço, no Regimento de Comandos da Amadora, no dia 9 de Janeiro [1976], dirigindo-se aos militares a propósito das campanhas, calunias e provocações direcionadas. Apelo aos militares para não se deixarem instrumentalizar e manifesta o seu agrado pelas suas últimas atuações, sua coragem e imagem de isenção que demonstraram. A seguir a esta reportagem o locutor aborda o tema do Apartidarismo e sua importância. as várias temáticas são intercaladas com música.?
Cota antiga
P10P1
Idioma e escrita
Português
Existência e localização de originais
Áudio analógico (em fita de arrasto)
Existência e localização de cópias
Ficheiros digitais WAP (matriz), MP3 e MP4 (derivadas).
Transcrição
(José Manuel Costa Neves) À cerca do 11 de Março, eu também sou suspeito a falar, na medida em que fui um dos superintendentes da Comissão de Inquérito, não desde o início, eu não me recordo agora exatamente da data, mas talvez aí um mês e tal dois meses depois do início do inquérito ou até talvez menos um mês vá lá, entre um mês dois meses, para ser preciso. Repare-se, naquela altura, houve também um incidente militar, chamemos lhe assim, houve tiros, houve mortos, não interessa agora analisar porque é que morreram ou porque é que deixaram de morrer, porque é que se deram os tiros ou se deixaram de dar, mas o que é certo é que nós vivíamos um período conturbado, haveria, havia nessa altura uma vontade enorme e que eu espero que continue a existir de levar o processo revolucionário para a frente e portanto, naquela confusão gerada pelos acontecimentos de 11 de Março, organizou-se uma Assembleia, a célebre Assembleia do 11 de Março, Assembleia Revolucionária do 11 de Março, na qual nasceu a Comissão de Inquérito do 11 de Março. Essa Comissão de Inquérito tem sofrido muitas acusações, em que eu estou, estou em boa situação para o poder afirmar, muitas delas injustas, é preciso reparar-se, naquela altura, e dada a maneira como foi formada a Comissão de Inquérito, houve todo um problema de organização, que só com o tempo é que se veio a resolver e que está a servir e devo dizer também aqui com toda a clareza, foi essa experiência dessa Comissão de Inquérito de 11 de Março que nos tem servido para melhor atacarmos agora o problema do 25 de Novembro.02m16: (José Manuel Costa Neves) Quanto à capacidade de trabalho desses camaradas, não está em causa, trabalharam imenso, aliás como estão a trabalhar, noite e dia, agora os encarregados do inquérito do 25 de Novembro e o Serviço da Polícia Judiciária Militar o volume de trabalho era imenso e sobretudo, é preciso não esquecer que desde o início houve um choque entre a legalidade e a legitimidade, naquela altura a Comissão de Inquérito do 11 de Março e podemos considerar que a Comissão de Inquérito do 25 de Novembro também, tinham uma legitimidade revolucionária que fatalmente colidia com a legalidade, ora foi do casamento da legitimidade com a legalidade que resultaram os ensinamentos que agora estamos a utilizar, não só e como disse à um bocado, para reformular certas leis e certos métodos de trabalho. O Serviço da Polícia Judiciária Militar na sua fase inicial ganhou bastante com a experiência dessa Comissão de Inquérito de 11 de Março, muito embora, e como é evidente, não é, trabalho e moldes totalmente diferentes e torno a repetir o Serviço de Polícia Judiciária Militar baseia-se na legalidade.04m02: (José Manuel Costa Neves) Muita gente especula também quanto à morosidade dos trabalhos do 11 de Março e com razão para quem não está por dentro dos assuntos tem toda a razão, realmente foi um processo tremendamente moroso. Eu já dei o fundamento principal dessa morosidade, que foi exatamente não termos organização capaz, de logo de início, fazer um trabalho coerente e repare que digo coerente sobre o ponto de vista metodologia, não é não coerente sobre o ponto de vista, sobre o ponto de vista, ideológico, digamos, e que só ao longo do tempo é que se foram corrigindo com os erros cometidos. Aconteceu, porém, que tinha sido cometida à Comissão de Inquérito de 11 de Março apenas a fase de investigação, de investigação dos acontecimentos, ora é evidente que acabada a fase de investigação, teríamos que entrar na fase de instrução, na fase de instrução, que será aquela que começará, que iniciará todo um processo de atribuição de responsabilidade criminal aos eventuais implicados. Ora esta fase de instrução começou relativamente tarde, eu não posso precisar, mas talvez à três meses, com a constituição de uma promotoria de instrução do tribunal, o chamado Tribunal Militar Revolucionário, que aliás o Conselho da Revolução já, já revogou o decreto que o constituía, mantendo pura e simplesmente a promotoria de instrução e portanto, a fase de investigação foi realmente, pelas razões que eu já contei, realmente demasiado longa, demasiado longa e não, e atendendo a que pela falta de experiência dos seus membros não, não teve uma base legal, portanto, a transferência dos trabalhos da Comissão de Inquérito para um órgão legal que se irá basear, ou melhor, está a basear-se, exclusivamente, nas leis e códigos vigentes, portanto, tudo isto provocou um atraso grande nos trabalhos relativos ao 11 de Março. Já tive oportunidade de dizer que estava convencido e estou ainda convencido, que muito brevemente os julgamentos começarão, estamos agora um bocadinho pendentes da formação dos tribunais, neste momento estão a ser criados os cinco Tribunais Militares Territoriais da responsabilidade, portanto, criação da responsabilidade do Chefe de Estado Maior do Exército, do Senhor General Eanes a quem serão, portanto, entregues os casos quer do 11 de Março, quer da PIDE-DGS que estão sob o foro militar, como toda a gente sabe, quer do próprio 25 de Novembro.07m11: (José Manuel Costa Neves) Portanto, toda essa experiência do 11 de Março tem servido agora para eliminar certos erros que foram cometidos sobre o ponto de vista metodológico, nomeadamente, essa separação da fase de investigação e da fase de instrução propriamente dita, neste momento, relativamente ao 25 de Novembro, nós já iniciamos as duas fases, temos uma fase de investigação que está cometida à Comissão de Inquérito do 11 de Março, mas simultaneamente, iniciamos já a fase de instrução que é da responsabilidade, como já tive oportunidade de dizer, do Serviço de Polícia Judiciária Militar. Estou absolutamente convencido que isto provocará um ganho de tempo extraordinário, quer no esclarecimento da história do 25 de Novembro, as suas razões e as suas consequências e os factos e também na atribuição, na atribuição da responsabilidade criminal individual caso ela exista.09m04: (José Manuel Costa Neves) Sobretudo, exatamente por estar dentro dos trabalhos relativos ao 25 de Novembro, portanto, não devendo comprometer-me antes desses trabalhos dados por findos, limitar-me-ei a afirmar, portanto, que sem dúvida alguma o 25 de Novembro, independentemente das intenções dos militares e civis que nele colaboraram, constituiu um perigo para o avanço do processo revolucionário. Quero com isto dizer, que em minha opinião muito pessoal e torno a repetir, independentemente das intenções e das ideologias das pessoas que nele se comprometeram, sou do parecer que o 25 de Novembro prejudicou o processo revolucionário, na medida até que ajudou ainda mais a dividir os militares e eu considero que sem as Forças Armadas não temos revolução. Portanto, destruindo as Forças Armadas a revolução está em perigo e, portanto, dado os factos, dado que temos cento e tal camaradas nossos, neste momento afastados do processo, quanto mais não seja, temporariamente, é evidente que as forças de esquerda enfraqueceram. Devo também dizer que o mesmo aconteceu no 11 de Março, que foi o primeiro desmembramento das Forças Armadas e estou plenamente convencido que também no 11 de Março, grande maioria dos camarada e não digo a totalidade como não digo a totalidade do 25 de Novembro, por princípio, também são homens que podem dar uma contribuição fundamental ao andamento do processo, portanto, respondendo concretamente à sua pergunta sobre o 25 de Novembro, o 25 de Novembro objetivamente foi prejudicial, foi prejudicial ao processo que nós queremos levar adiante. Eu estou convencido que teve esse sinal positivo e estou com pelo menos, é capaz de ter tido o condão para mim e para muita gente já o tinha, já o tinha dito, quer dizer, já estávamos razoavelmente esclarecidos sobre os perigos, não é? Agora estou convencido que muita gente com o 25 de Novembro ficou absolutamente ciente de que não é com demagogias e não é com demagogias por um lado, por outro lado, com utopias que se leva um processo revolucionário adiante.12m27: (José Manuel Costa Neves) Processo revolucionário tem que ser feito com inteligência, tem que ser feito com sangue frio, tem que ser feito até e muito especialmente, no nosso caso, com muita humanidade, sempre atendendo a que estamos a lidar com homens e não com bonecos, não com marionetas e, portanto, isto que se passou é mais um alerta de que realmente não é fácil fazer uma revolução, não é só com palavras que a fazemos nem com vontade de a fazer é preciso saber fazê-la.14m45: Estado Maior General das Forças Armadas. Dentro de meio minuto daremos lugar ao Boletim de Notícias que a redação da Rádio de Difusão Portuguesa preparou para as dez horas. Voltamos logo a seguir.15m11: Estado Maior General das Forças Armadas. Segunda parte do programa especial do Estado Maior General das Forças Armadas. Este programa da intervenção social aparece todos os domingos, no primeiro programa da Rádio Difusão Portuguesa, Onda Média e Frequência Modelada, entre as nove e as onze da manhã.19m45: Reportagem. Vasco Lourenço no Regimento de Comandos da Amadora, no dia 9 de janeiro.20m29: (Vasco Lourenço) Atenção Comandos, outras forças políticas tentarão agora a sua chance de vos por ao seu serviço e as primeiras não desistirão certamente. Bem sabeis, que já há sinais evidentes das tentativas que referi. Se vós soubésseis resistir e desprezar campanhas de calunia e de provocações, temos de saber resistir e desprezar campanhas de adulação.21m46: (Vasco Lourenço) A vossa consciência de homens não está à venda e o soldado só serve o povo, nunca outro patrão. As Forças Armadas terão de saber em todos os momentos cumprir cabalmente a sua vocação nacional e nunca se deixarem instrumentalizar. Temos hoje como nos momentos difíceis de ontem, em que altas vozes se levantavam contra vós a minha confiança e o meu apoio. Apesar de ser uma unidade de reserva do Estado Maior do Exército continuo a contar convosco, principalmente, dado o facto de que a vossa principal, senão total atuação, continuará a ser comandada pela Região Militar de Lisboa como até aqui e não deixo de vos manifestar o meu agrado pelas vossas atuações últimas, que não sendo bem operações para as características Comando vós tendes comprido com elevação e serenidade, não cedendo a pressões de nenhuma espécie e dando ao povo português uma bela imagem de isenção e de coragem pela chefia. Em meu nome pessoal e em nome da Região Militar de Lisboa parabéns.24m55: Mais uma vez o Brigadeiro Vasco Lourenço aproveitando a visita ao Regimento de Comandos da Amadora acentuou o aspeto fundamental por onde passa a operacionalidade, a unidade e a própria disciplina revolucionária e esse aspeto fundamental é o apartidarismo.26m18: Todos nós sabemos que as mais diversas forças políticas se têm empenhado na instrumentalização partidária das Forças Armadas, por isso não admira que um dos homens com maior responsabilidades do MFA, volte a repisar a importância do apartidarismo, para que a revolução portuguesa se não adultere. E o apartidarismo tão atacado ao longo da revolução portuguesa tem sido, afinal, o bastião vulnerável contra o qual têm esbarrado aqueles que até hoje minimizaram a capacidade revolucionária do Movimento das Forças Armadas.27m46: A unidade das Forças Armadas será tanto mais forte, mais coesa e mais disciplinada, quanto os militares corporizarem cabalmente o espírito do apartidarismo, entendido como uma arma crítica, antidogmática e anti sectária, enfim, a busca sem tréguas da síntese criadora que proporcionará ao MFA o caminho para uma autêntica democracia, na liberdade e no socialismo.